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Foto: Divulgação/Google |
Já se passava das nove horas da
noite. Uma quarta-feira fria daquele período de novembro que não sabia se
esquentava ou esfriava. Em casa parecia ser quente. Mas na rua o calafrio
apertava. O interfone da minha casa tocou e eu atendi. Em uma voz que não me
permitia entender se era um adulto ou uma criança ouvi: “Você tem um cobertor
para me dar?”.
Na frente da Nossa Senhora
Peregrina que visita as casas da cidade, minha mãe me mandou dizer para que a
pessoa aguardasse ela. E ao chegar na frente da casa se deparou com uma
criança. Com cabelos meio arrepiados e negros, olhos que nem eram puxados como
de um japonês ou chinês – eu tenho dificuldade para diferenciar um do outro – nem
redondos como de um ocidental, um menino de dez anos rapidamente relatou era de família indígena e estava com a mãe e mais dois irmãos –
um de dois anos e outro de dois meses – dormindo nas ruas da cidade. Eles
queriam um cobertor para se tapar durante aquela noite.
O menino entrou. Minha mãe o
serviu. E numa breve fala me disse o nome que eu rapidamente esqueci. Apeguei-me
mesmo foi ao que ele me contou sobre sua vida. Em rápidas e curtas frases ele disse que gostava de estudar Português e Matemática. E falou, ainda, que é
goleiro do time de futebol da escola. Sobre a família, falou que tinha três
irmãos e que todos vivem com a mãe. O pai já faleceu e, segundo o menino, teria
sido trabalhando como carpinteiro.
Um aperto tomou meu coração ao
escutar isto. E ao mesmo tempo percebi o quão feliz era aquela criança. O
garoto é bilíngue, fala Português e Guarani, tribo à qual ele pertence. E na
língua materna, me falou sobre sua atividade predileta: “Eu gosto de brincar”.
A tristeza que tomou o meu
coração se confundiu com a emoção que senti ao ouvir uma criança aparentemente
tão sofrida me dizer que sua felicidade se completa com tão pouco. O pequeno
menino me disse que suas brincadeiras são esconde-esconde e pega-pega.
Certamente, e mesmo diante da vida que leva, ele é feliz nas pequenas coisas.
Serviu-me de exemplo. Tocou o meu
coração. Quem me dera se o mesmo acontecesse, ao menos, com quem lesse este
texto. Nunca vou me esquecer daquela frase em Guarani que eu não sei traduzir, mas ele me disse também em Português: “Eu
gosto de brincar”.
Heloiza Abreu
Do fundo do meu coração, a partir de uma experiência vivida.
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